Temer conta com apoio folgado no Congresso, mas enfrenta denúncias de envolvimento na Lava Jato
[caption id="attachment_256011" align="alignleft" width="300" caption="Presidente afastada será julgada pelos senadores na fase final do processo"]

[fotografo]Elza Fiúza/Agência Brasil[/fotografo][/caption]Por 59 votos a 21, sem abstenções, os senadores aprovaram há pouco o parecer de Antonio Anastasia (PSDB-MG) sobre o processo de
impeachment e a presidente afastada Dilma Rousseff passa oficialmente à condição de ré em processo por crime de responsabilidade (veja abaixo como cada senador votou). Após a conclusão desta segunda etapa, que registrou o discurso de 47 oradores, Dilma irá a julgamento na fase final do processo, em sessão prevista para ser realizada a partir de 25 de agosto. Em raro registro sobre o número de presentes, o painel eletrônico do plenário mostrava quórum de 81 senadores em boa parte da sessão - mas, ao final dos trabalhos, exatamente às 2h38 desta quarta-feira (10), 80 nomes ainda constavam dos registros.
Foram mais de 16 horas de sessão em plenário para que o relatório de Anastasia, uma vez aprovado, abrisse caminho para o último ato no Senado, depois de um período de oito meses de disputas - enredo iniciado com a
decisão pró-impeachment por parte do ex-presidente da Câmara Eduardo Cunha (PMDB-RJ), anunciada em 2 de dezembro e vista como vingança por aliados da presidente afastada.
Coube a
Sérgio Petecão (PSD-AC) proferir o último discurso da jornada inciada às 9h44, quando uma rodada de
questões de ordem teve e início e consumiu toda a manhã desta terça-feira (9). Por coincidência, também pertence ao PSD o primeiro senador a discursar na tarde de ontem -
José Medeiros (MT), estreante no Legislativo federal. Ambos votaram contra Dilma.
Conduzida pelo presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Ricardo Lewandowski, a votação de hoje é encarada como um termômetro para o julgamento final. Nesta etapa, exige-se ao menos 41 votos para que o texto seja aprovado - ou seja, o grupo contrário ao retorno da presidente ao cargo conseguiu quase 20 votos a mais. A margem dá mais segurança ao presidente interino Michel Temer, cada vez mais próximo da confirmação no cargo como efetivo, para a votação definitiva.
No dia 12 de maio, o
afastamento da presidente foi aprovado por 55 votos, no que foi a primeira sinalização de que a petista não teria vida fácil no Senado. Todos os senadores contra Dilma mantiveram o posicionamento, e ainda contaram com a adesão de outros quatro parlamentares. Por outro lado, a presidente afastada perdeu um voto entre os 22 da primeira votação - João Alberto Souza (PMDB-MA), aliado do ex-presidente da República José Sarney e presidente do Conselho de Ética do Senado. A exemplo do que fez naquela ocasião, o presidente da Casa,
Renan Calheiros (PMDB-AL), não votou.
[caption id="attachment_256142" align="alignright" width="399" caption="Em registro quase inédito, painel mostra a presença de 81 senadores"]

[fotografo]Fábio Góis/Congresso em Foco[/fotografo][/caption]
Fla x Flu
No encaminhamento final para a votação, defesa e acusação falaram por 30 minutos, cada, para o conjunto do plenário. E, de novo, ganhou protagonismo em plenário o duelo verbal entre a tese de "golpe", defendida pelos partidários de Dilma, e a do cumprimento à Constituição, à luz da legislação sobre crime de responsabilidade, argumentação dos parlamentares pró-impeachment.
"Ela não merece mais governar o Brasil, porque a forma com que ela governou levou o Brasil ao desastre em que ele se encontra. E de que forma ela governou? Ela governou através da obscuridade, através da mentira", fustigou o jurista Miguel Reale Jr., que se encarregou da explanação acusatória. Para o especialista, senadores devem levar em conta para a definição seus votos o "conjunto da obra", isso é, a reunião de supostos malfeitos de Dilma.
"Quem afasta o presidente da República pelo conjunto da obra é o povo, na eleição!", rebateu o ex-ministro da Advocacia-Geral da União José Eduardo Cardozo, que faz a defesa de Dilma desde a fase inicial de tramitação do processo na Câmara. "Há desrespeito constitucional pelos eleitores de Dilma Rousseff", acrescentou.
Depois da discussão entre defesa e acusação, senadores ainda tiveram que deliberar sobre três destaques para votação em separado, com quatro oradores (dois contra e dois a favor) inscritos para discutir cada um deles. Os destaques se referiam às chamadas pedaladas fiscais (Plano Safra) e assinatura de dois decretos de crédito orçamentário alegadamente sem autorização do Congresso (um de R$ 29 bilhões, assinado em 27 de julho de 2015; e outro de R$ 600 milhões, com a data de R$ 20 de agosto do mesmo ano). Senadores contra o impeachment queriam retirar do relatório a configuração de crime de responsabilidade atribuída a Dilma nesses três pontos. Mas, com ampla maioria em plenário, a base aliada de Temer suplantou a minoria favorável à petista e rejeitou todos os destaques.
Rito
A partir da aprovação do parecer, acusação e defesa serão intimadas para que apresentem, em até 48 horas, o libelo acusatório - termo jurídico utilizado para a consolidação das acusações e provas produzidas durante as investigações - e, também, a contra-argumentação. Nesse momento, tanto acusação quanto defesa terão que apresentar os nomes das seis testemunhas a serem convocadas para cada lado.
Os autores da denúncia contra Dilma - os juristas Miguel Reale Jr., Hélio Bicudo e Janaína Paschoal - já informaram que pretendem entregar o libelo acusatório no prazo de 24 horas, com o objetivo de adiantar a finalização do processo. Já a defesa de Dilma garante que usará todo o tempo definido na legislação pertinente para apresentar a contra-argumentação.
A sessão de julgamento ainda não foi marcada oficialmente, e só será agendada após o recebimento dos documentos da acusação e da defesa. Além disso, as partes precisam ser notificadas com dez dias de antecedência.
[caption id="attachment_256143" align="alignleft" width="300" caption="Temer conta com apoio folgado no Congresso, mas enfrenta denúncias de envolvimento na Lava Jato"]

[fotografo]Marcelo Camargo/Agência Brasil[/fotografo][/caption]
Temores
Nos bastidores, o Palácio do Planalto tem pressa e trabalha para que o julgamento aconteça ainda no mês de agosto, para que Michel Temer deixe a condição de interino e possa comparecer à reunião do G-20 já como presidente efetivo. O encontro será realizado na China, nos dias 4 e 5 de setembro.
Mas o que preocupa Temer de fato, segundo adversários (principalmente petistas), é a sequência de notícias sobre delações premiadas da
Operação Lava Jato envolvendo Temer e alguns de seus ministros - entre eles o presidenciável tucano José Serra, ora titular do Ministério das Relações Exteriores, acusado de ter recebido
R$ 23 milhões via caixa dois.
Já o presidente interino recebeu, de acordo uma das delações,
R$ 10 milhões em dinheiro vivo. Tanto Serra quanto Temer, assim como os demais ministros, têm recorrentemente negado as acusações - um deles, Romero Jucá (PMDB-RR), também foi alvejado por denúncias e, em consequência, perdeu o posto de ministro do Planejamento.
Além disso, governistas temem que o processo de cassação de Cunha seja aprovado na Câmara antes da votação final sobre Dilma, embora haja
articulação no sentido contrário. Na avaliação de parlamentares ligados a Temer, o peemedebista pode, uma vez fora do mandato e sem a prerrogativa de foro privilegiado, rebelar-se por ter de ser julgado pelo juiz
Sergio Moro, responsável pela Lava Jato em primeira instância e conhecido pelo rigor na punição a investigados por corrupção. Assusta o Palácio do Planalto, de acordo com fontes próximas ao presidente interino, a possibilidade de que uma delação premiada de Cunha atinja diversos parlamentares de vários partidos, principalmente o PMDB, além do próprio Temer.
Último passo
A sessão que definirá o futuro político de Dilma será novamente conduzida pelo presidente do Supremo Tribunal Federal, ministro Ricardo Lewandowski. Para condenar a presidente é preciso o voto de pelo menos 54 dos 81 senadores. Neste caso, Dilma deixa definitivamente o cargo, perde os direitos políticos por oito anos e Michel Temer é efetivado na Presidência da República. Caso contrário, a presidente é absolvida e reassume imediatamente o mandato.
Veja o voto de cada senador sobre o relatório de Anastasia:
-
Acir Gurgacz (PDT-RO) - SIM
-
-
Aloysio Nunes Ferreira (PSDB-SP) - SIM
-
Alvaro Dias (PV-PR) - SIM
-
Ana Amélia (PP-RS) - SIM
-
Angela Portela (PT-RR) - NÃO
-
Antonio Anastasia (PSDB-MG) - SIM
-
Antonio Carlos Valadares (PSB-SE) - SIM
-
Armando Monteiro (PTB-PE) - NÃO
-
Ataídes Oliveira (PSDB-TO) - SIM
-
Benedito de Lira (PP-AL) - SIM
-
Cássio Cunha Lima (PSDB-PB) - SIM
-
Cidinho Santos (PR-MT) - SIM
-
-
Cristovam Buarque (PPS-DF) - SIM
-
Dalirio Beber (PSDB-SC) - SIM
-
Dário Berger (PMDB-SC) - SIM
-
-
Edison Lobão (PMDB-MA) - SIM
-
Eduardo Amorim (PSC-SE) - SIM
-
-
Eduardo Lopes (PRB-RJ) - SIM
-
Elmano Férrer (PTB-PI) - NÃO
-
-
Fátima Bezerra (PT-RN) - NÃO
-
Fernando Bezerra Coelho (PSB-PE) - SIM
-
Fernando Collor (PTC-AL)- SIM
-
Flexa Ribeiro (PSDB-PA) - SIM
-
Garibaldi Alves Filho (PMDB-RN) - SIM
-
Gladson Cameli (PP-AC) - SIM
-
-
Hélio José (PMDB-DF) - SIM
-
-
Ivo Cassol (PP-RO) - SIM
-
-
João Alberto Souza (PMDB-MA) - SIM
-
João Capiberibe (PSB-AP) - NÃO
-
Jorge Viana (PT-AC) - NÃO
-
José Agripino (DEM-RN) - SIM
-
José Aníbal (PSDB-SP) - SIM
-
José Maranhão (PMDB-PB) - SIM
-
-
José Pimentel (PT-CE) - NÃO
-
Kátia Abreu (PMDB-TO) - NÃO
-
Lasier Martins (PDT-RS) - SIM
-
-
-
Lúcia Vânia (PSB-GO) - SIM
-
-
Marta Suplicy (PMDB-SP) - SIM
-
- Otto Alencar (PSD-BA) - NÃO
-
Paulo Bauer (PSDB-SC) - SIM
-
Mais sobre impeachment
Mais sobre crise brasileira