Governabilidade não pode se apoiar apenas na composição com a maioria conservadora do Congresso Nacional, defende ex-ministro
Congresso em Foco
08/11/2023 | Atualizado às 10h30
A-A+
COMPARTILHE ESTA NOTÍCIA
Gilberto Carvalho: "A esquerda tem de mudar o seu jeito de fazer. A igreja tem de mudar o jeito de lidar, nós temos que conviver com os pobres". Foto: Marcelo Camargo/ABr
Próximo de Lula, de quem foi chefe de gabinete durante os seus dois primeiros mandatos presidenciais (2003 a 2010), o atual secretário nacional de Economia Popular e Solidária, Gilberto Carvalho, está preocupado com os rumos do governo, da esquerda e da Igreja Católica, da qual é membro. No seu entender, tanto a igreja a que pertence quanto as forças de esquerda se distanciaram da população mais carente, deixando o caminho aberto para os evangélicos e para uma direita com "uma militância ferrenha que se expressa de maneira absurda nas redes sociais e que faz a cabeça dos pobres".Em debate promovido em Brasília pela Comissão Justiça e Paz, da Igreja Católica, na noite da última segunda-feira (5), ele procurou mostrar que a governabilidade não pode se apoiar apenas na composição com a maioria conservadora do Congresso Nacional. Fazer concessões, argumentou, é insuficiente porque "eles não nos aceitam". "No primeiro momento que eles puderem, eles vão nos derrubar, porque a nossa lógica vai contra a lógica deles", acrescentou. E concluiu: "Só tem um jeito de dar governabilidade - investir na conscientização e na participação popular".Veja o vídeo, com legenda:Um dos fundadores do PT, Gilberto Carvalho, 72 anos, é formado em Filosofia, estudou Teologia e chegou a ser seminarista. Mesmo sem nunca ter exercido mandato político, sempre foi um formulador muito ouvido dentro do seu partido e é um dos principais interlocutores petistas com a Igreja Católica. Ministro da Secretaria-Geral da Presidência durante o primeiro mandato da ex-presidente Dilma Rousseff (2011 a 2014), também dirigiu a Escola Nacional de Formação do PT. No ano passado, foi um dos articuladores da carta divulgada pelo então candidato Lula à comunidade evangélica, comprometendo-se a não apoiar o aborto e a respeitar a liberdade religiosa. Hoje à frente de uma secretaria vinculada ao Ministério do Trabalho e Emprego, Gilberto Carvalho enfatizou, no encontro de segunda-feira: "A esquerda tem de mudar o seu jeito de fazer. A igreja tem de mudar o jeito de lidar, nós temos que conviver com os pobres. Nós temos que estar perto". Fazer um bom governo, no seu entender, jamais será o bastante."Não adianta nada" - continuou - "fazer tudo isso e depois vem um golpe e derruba tudo. E o povo volta a viver uma experiência pior do que a que vivia. Então, amar o pobre, não desviar do pobre, também é investir, insistir na educação popular, na conscientização. Fazer de cada ato, de cada conquista dessa, um momento de educação, de autoconsciência."Ainda em sua exposição, Gilberto Carvalho contou que expressou suas percepções a Lula em uma conversa que tiveram recentemente. Relatou que disse ao presidente não ter dúvida de que o atual governo vai dar certo, que a economia vai crescer e que a fome será reduzida, ainda que em escala menor que a registrada nas duas gestões passadas do petista, em razão das circunstâncias internacionais menos favoráveis. Mas fez um alerta:"O que eu falei para ele foi o seguinte: esse dar certo já deu uma vez, mas deu errado, porque durou pouco. Isso é uma irresponsabilidade nossa com os pobres. Nós temos que construir projetos duráveis, projetos sustentáveis, e não tem outra sustentação que o poder popular."Crítico do papa João Paulo II, a quem responsabiliza pelo afastamento dos católicos da população mais pobre, e admirador do Papa Francisco, Gilberto Carvalho defendeu mudanças profundas na igreja a que pertence, incluindo o fim do celibato (possibilitando que membros do clero sejam autorizados a se casarem) e a permissão para que mulheres sejam ordenadas (conquistando o direito de celebrar missas e outros atos religiosos)."Senão, nós vamos ter muita dificuldade de chegar no povão. E isso está muito claro, a realidade está mostrando."Também participarem do debate de segunda-feira, no Centro Cultural de Brasília, instituição ligada à Igreja Católica, os padres Júlio Lancellotti e Miguel Martins e a mediadora Ana Paula Inblez Barbalho, mediadora do debate e integrante da Comissão Justiça e Paz.Íntegra da live: