[caption id="attachment_286205" align="aligncenter" width="462" caption="Membros do alto escalão do governo Temer estão entre citados "]
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[fotografo]Beto Barata/PR[/fotografo][/caption]
Assim que a imprensa divulgou o envio da lista com o pedido de abertura de
83 inquéritos ao Supremo Tribunal Federal (STF) com base nas delações premiadas feitas por executivos da Odebrecht à força-tarefa da
Operação Lava Jato, parlamentares comentaram o tema no Congresso. O senador
Humberto Costa (PT-PE) disse que, mais que os integrantes do Legislativo, quem deve estar "muito mais preocupado" com o envio do documento assinado pelo procurador-geral da República, Rodrigo Janot, é o governo.
"A ser verdadeiro, o conjunto de vazamentos que aconteceram citando ministros, líderes do governo, enfim. Isso vai produzir uma imensa turbulência para o governo Temer. Isso gera um ambiente de instabilidade mas não creio que chegue ao ponto de impedir que as matérias mais importantes sejam votadas. O que pode gerar essa turbulência na pauta é se realmente o governo for atingido no seu coração", ressaltou o senador. "Esperamos que os delatores tenham sido fiéis e não tenham mentido em relação a quem eventualmente tenha cometido algum tipo de irregularidade", acrescentou.
Questionado sobre a possibilidade de o pedido de abertura das investigações atrasar votações previstas pelo Legislativo, o líder do PSDB no Senado, Paulo Bauer (SC), avaliou que, apesar das "consequências" trazidas pela divulgação dos parlamentares citados na delação, "o Senado tem que cumprir o seu dever constitucional".
"Naturalmente que a lista, se alcançar alguns senadores, vai trazer alguma consequência como algum debate, alguma discussão, algum atraso, mas não vai nos impedir de continuarmos votando os assuntos de interesse do país e discutindo esses problemas que hoje precisam ser enfrentados pelo Brasil", disse Bauer.
Investigado pela Lava Jato, o senador Edison Lobão (PMDB-MA) falou que "não vê nenhuma razão maior para tensão": "Vários senadores já estão submetidos à investigação. E muitos deles, inclusive eu, temos tido esses inquéritos arquivados por falta de completa procedência da delação".
Enquanto isso, o novo líder do governo no Senado, Romero Jucá (PMDB-RR), enfatizou que "quem tiver cometido crime tem que pagar". Ainda de acordo com o senador, "não há nenhuma verdade em qualquer tipo de delação a não ser que seja comprovada". "Acho que colocar uma nuvem negra em toda a classe política é um desserviço para o Brasil", avaliou o líder.
Na Câmara, o deputado Delegado Waldir (PR-GO) afirmou que a preocupação paira entre os parlamentares da Casa desde a semana passada. Na última sexta-feira (10), alguns rumores sobre a possibilidade da lista ser enviada ao STF surgiram. Entretanto, a medida só foi oficializada nesta terça-feira (14). Ao defender a quebra de sigilo das apurações da maior delação da história do país, o deputado também se mostrou favorável ao fim do foro privilegiado.
"O comportamento de muitos parlamentares e o nervosismo é evidente. [...] O fim do foro privilegiado seria espetacular. A tsunami seria maior", ressaltou o deputado.
Em mensagem enviada a membros do Ministério Público Federal (MPF) no início da noite de hoje (terça, 14), Janot diz que embora já fossem presumidas por muitos, "as revelações que surgem dos depoimentos nos confrontarão com a triste realidade de uma democracia sob ataque e, em grande medida, conspurcada na sua essência pela corrupção e pelo abuso de poder econômico e político" (leia a íntegra da mensagem abaixo). Ao final, Janot pede coragem e confiança aos profissionais. O texto foi divulgado pelo site
Poder360.
A lista
O procurador-geral da República, Rodrigo Janot, enviou ao Supremo Tribunal Federal (STF), nesta terça-feira (14), 83 pedidos de abertura de inquérito com base nos acordos de delação premiada firmados com 77 executivos e ex-executivos do grupo Odebrecht na
Operação Lava Jato. No pacote de 320 pedidos, Janot também solicita 211 declínios de competência para outras instâncias da Justiça, nos casos que envolvem pessoas sem prerrogativa de foro, além de sete arquivamentos e outras 19 providências.
De acordo com a PGR, não é possível divulgar detalhes sobre os termos de depoimentos, inquéritos e demais peças enviadas ao STF por estarem em segredo de Justiça. Rodrigo Janot pediu ao relator do caso no STF, ministro Edson Fachin, a retirada do sigilo desse material considerando a necessidade de promover transparência e garantir o interesse público.
Estima-se que nomes como o ministro chefe da Casa Civil, Eliseu Padilha, o líder do governo no Senado, Romero Jucá (PMDB-RR), e aliados de peso do governo como o senador
Aécio Neves, estejam entre os pedidos de Janot por terem sido citados por executivos da Odebrecht.
A íntegra da mensagem enviada por Janot aos membros do MPF:
"
Colegas,
Gostaria de prestar diretamente a vocês algumas informações sobre o trabalho realizado a partir da colaboração da empresa Odebrecht, no âmbito da investigação Lava Jato, considerando a relevância do caso, sua magnitude e seus impactos para o futuro da Instituição.
Como já é de conhecimento geral, no fim do ano passado, firmamos um grande acordo de colaboração com a empresa e com diversas pessoas físicas que integram seu corpo diretivo. No total, 77 executivos e ex-executivos da Odebrecht firmaram o acordo e prestaram declarações em que revelam os meandros da corrupção em nosso país de forma jamais imaginada. Isso sem falar nos acordos de leniência firmados com as empresas do grupo.
A preparação do acordo exigiu a realização de pelo menos 48 reuniões entre as partes, no período de fevereiro a dezembro de 2016. Na sequência, envolvemos mais de 100 colegas, em 34 unidades do Ministério Público Federal, para colher os 950 termos de declaração dos colaboradores em apenas uma semana.
Esse trabalho exigiu de todos nós envolvidos no processo um esforço sobre-humano para colher-se os depoimentos, organizá-los, elaborar petições e, por fim, encaminhar todo o caso ao Supremo Tribunal Federal. Todas essas tarefas foram ultimadas em apenas 15 dias, de modo que, antes do recesso, o material já estava à disposição da Corte para exame e homologação.
Por óbvio, um trabalho dessa envergadura só poderia ser fruto de uma equipe realmente comprometida com as graves responsabilidades que pesam sobre a Instituição. Não só o Grupo de Trabalho que me auxilia, como também os colegas da Força-Tarefa de Curitiba, em um trabalho de colaboração mútua, viabilizaram o êxito dessa empreitada. Preparamos, GT-PGR e FT-Curitiba, toda a logística necessária para elaborar, revisar, assinar os acordos e colher os 950 termos de declaração que, em seguida, foram encaminhados ao STF, por petições, para homologação.
Os termos dos 77 acordos celebrados foram homologados no fim do mês de janeiro pela Ministra-Presidente, Cármen Lúcia. Desde então, as dedicadas equipes do GT-PGR e da FT-Curitiba trabalharam incessantemente para organizar o material e dar o tratamento jurídico adequado e individualizado a cada caso.
Ainda como efeito do acordo celebrado, realizamos, sob a liderança do MPF, no mês de fevereiro, reunião com chefes de 10 Ministérios Públicos ibero-americanos e reuniões específicas com um MP africano para tratarmos das repercussões do caso Odebrecht naqueles países, já que parte dos fatos revelados nas colaborações e acordos de leniência dizem respeito a atos de corrupção ocorridos naquelas jurisdições estrangeiras.
Podemos, com isso, dizer que antecipamos em 3 anos o objetivo previsto no Planejamento Estratégico Institucional de ser o Ministério Público Federal reconhecido nacional e internacionalmente pela excelência na atuação no combate ao crime e à corrupção.
Dos pedidos de homologação encaminhados, originaram-se 320 providências requeridas ao STF, assim distribuídas: 83 pedidos de instauração de inquérito, 211 pedidos de declínio de atribuição, 7 promoções de arquivamento, 19 outras providências.
Por esse trabalho extraordinário, gostaria de publicamente empenhar meu sincero agradecimento e respeito aos colegas do Grupo de Trabalho - PGR e da Força-Tarefa - Curitiba. Agradeço profundamente aos membros que nos auxiliaram, a partir de suas unidades, na coleta dos depoimentos, sem prejuízo de suas atribuições ordinárias, e aos dedicados servidores que trabalharam arduamente nas tarefas de logística fundamentais para o sucesso do empreendimento.
Devo ainda ressaltar, para reflexão geral, que, sem uma equipe de natureza permanente e composta por membros para apoio ao Procurador-Geral da República, seria impossível levar a bom termo as graves responsabilidades do cargo que ora desempenho, em prejuízo não só do MPF como de todo o Ministério Público brasileiro.
Eis assim um relato objetivo do que representou, em tempo e números, o acordo da Odebrecht. Poderia encerrar o texto por aqui, mas a singularidade do momento impõem-me tecer ainda algumas considerações sobre os reflexos metajurídicos decorrentes desse acordo histórico.
A expectativa em relação ao encaminhamento que daríamos aos depoimentos decorrentes do acordo da Odebrecht tem provocado muita apreensão no meio político, na imprensa e na sociedade de forma geral. As revelações que surgem dos depoimentos, embora já fossem presumidas por muitos, lançadas assim à luz do dia, em um procedimento formal perante a nossa Suprema Corte, nos confrontarão com a triste realidade de uma democracia sob ataque e, em grande medida, conspurcada na sua essência pela corrupção e pelo abuso do poder econômico e político.
Certamente o MPF terá dois desafios institucionais a vencer a partir de hoje: manter, como sempre o fez, a imparcialidade diante dos embates político-partidários que decorrerão do nosso trabalho e velar pela coesão interna. Não temos a chave mágica para a solução de todos os problemas revelados com a Lava Jato - especialmente agora, com a colaboração da Odebrecht -, mas, na parte que nos compete, asseguro a todos vocês que continuarei a conduzir o caso sob o viés exclusivamente jurídico, sob o compasso da técnica e com a isenção que se impõe a qualquer membro do Ministério Público.
Por fim, é preciso ficar absolutamente claro que, seja sob o ponto de vista pessoal - sou um democrata congênito e convicto -, seja sob a ótica da missão constitucional do MP de defender o regime democrático e a ordem jurídica, o trabalho desenvolvido na Lava Jato não tem e jamais poderia ter a finalidade de criminalizar a atividade política.
Muito pelo contrário, o sucesso das investigações sérias conduzidas pelo MPF até aqui representa uma oportunidade ímpar de depuração do processo político nacional, ao menos para aqueles que acreditam verdadeiramente que é possível, sim, fazer política sem crime e que a democracia não é um jogo de fraudes, nem instrumento para uso retórico do demagogo, mas um valor essencial à sociedade moderna e uma condição indispensável ao desenvolvimento sustentável do nosso país.
Coragem e confiança!
Forte abraço.
Rodrigo Janot"
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