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Congresso em Foco
22/3/2017 | Atualizado às 15:32
Esse aumento, em grande parte, foi financiado pela ampliação das contribuições, o quê, em conjunto com o uso da âncora cambial para conter a inflação, prejudicou sobremaneira a competitividade das empresas nacionais, restringindo ainda mais potencial de crescimento da economia brasileira. A partir dos anos 90, vale lembrar, os empresários, sobretudo os da indústria, enfrentaram juros mais altos, impostos mais altos e câmbio valorizado, ao mesmo tempo que passaram a ser desafiados a lidar com uma abertura rápida e pouco planejada.
Paralelamente, o governo federal, que estava envolto em seus próprios problemas, viu erodir a capacidade de financiamento e gestão dos estados e municípios. Sem espaço político e fiscal para promover as mudanças necessárias no pacto federativo, a coalizão à frente do governo federal focou seus esforços na aprovação da lei de responsabilidade fiscal e nos mecanismos de contenção do endividamento estadual. Fez vistas grossas para o recrudescimento da guerra fiscal e para a completa deterioração dos serviços públicos locais.
Em seguida, Lula, assim que iniciou o governo, tentou viabilizar uma ampla reforma fiscal, mas não teve êxito nas negociações com o Congresso. O que se conseguiu na época foi apenas a aprovação da Emenda Constitucional nº42, que, entre outras coisas, determinava que o Senado avaliasse periodicamente a funcionalidade dos sistema tributário nacional.
Depois disso, em face das denúncias do mensalão, do aumento dos preços internacionais das commodities e da expectativa criada em torno dos recursos do pré-sal, a coalizão petista optou por ajustes pontuais na estrutura de financiamento de algumas políticas públicas e na instituição de regimes especiais para setores específicos. Houve até duas tentativas de reforma do ICMS pelo ex-ministro Mantega, mas a falta de visão comum sobre o pacto federativo acabou minando a aprovação da mudança.
Desse modo, o diagnóstico que emergiu logo após a promulgação da Carta de 1988 permanece o mesmo: não há compatibilidade entre os direitos estabelecidos na Constituição e sua lógica de financiamento. O mesmo ocorre no que se refere a outras macro funções do Estado, tais como a de promover o desenvolvimento tecnológico.
A efetivação do direito universal à educação esbarra na falta de estratégia para formar e valorizar professores e, ao mesmo tempo, ampliar a oferta de vagas na pré-infância, reduzir o número de alunos por classe no ensino fundamental, reestruturar o ensino médio e expandir a educação superior.
O aperfeiçoamento do sistema único de saúde esbarra na falta de capacidade financeira dos estados e da União, não só pelo subfinanciamento da saúde, mas também pela falta de investimentos em saneamento e segurança pública, o que acarreta níveis elevados de busca por hospitais, clínicas e licenças médicas, pressionando continuamente o sistema.
Os demais pilares da seguridade (assistência e previdência), por sua vez, estão sobrecarregados com a falta de uma estratégia robusta para combater a desigualdade social e com a frouxidão de certos critérios para se ter acesso aos benefícios previdenciários.
A melhoria da infraestrutura urbana e logística depende quase que exclusivamente da mão invisível do mercado, em face dos minguados recursos que sobram para esse fim no âmbito dos orçamentos públicos.
Dado esse contexto, a fé hoje existente no mercado é mais uma questão de necessidade do que de crença na consistência de seus princípios.
Na ausência de um pacto federativo consistente, saúde, educação, infraestrutura e até segurança passam a depender cada vez mais dos recursos da iniciativa privada. É uma questão de sobrevivência.
Se não conseguirmos resolver via Estado as questões fundamentais para nosso desenvolvimento, resta-nos o "cada um por si". Desse modo, como temos visto, exacerbam-se os conflitos e vemos os empreendedores (que são essenciais para o desenvolvimento nacional) serem tratados como vilões.
Nosso descompromisso com a efetiva implementação da Constituição, ao menos, ganhou mais uma evidência. Desde 2003, nunca foi realizada a avaliação periódica do sistema tributário nacional. Fica apenas nos discursos de alguns congressistas.
Para contribuir com a mudança dessa realidade, o Projeto Brasil 2030: da colaboração para o desenvolvimento produziu um material analisando a situação de nosso sistema tributário (veja aqui).
O material compila conclusões de diversos estudos, evidenciando os principais problemas de nosso sistema fiscal, bem como apontando caminhos para solução dos mesmos.
Em resumo, comparativamente a outros países, o Brasil gasta pouco com saúde e infraestrutura, e muito com judiciário, juros, previdência e administração tributária. Percebe-se também elevado nível de desigualdade salarial no serviço público, além de significativo descolamento da remuneração dos servidores públicos em relação à renda média da população.
Já do lado da receita, há alta concentração de impostos na produção e consumo, além de estarmos bem próximo ao topo do ranking de complexidade tributária.
O resultado disso é um baixo impacto das ações do governo brasileiro na redução das desigualdades sociais, conforme demonstra recente estudo do BID (Panorama de las Administraciones Públicas América Latina y el Caribe 2017):
Alguns dos caminhos para mudar essa situação já são relativamente consensuais:
Necessidade de simplificação radical de nosso sistema tributário, com instituição de um IVA que agregue diversos impostos sobre a produção e o consumo;
Transferência de parte da carga tributária sobre consumo e produção para impostos sobre renda e patrimônio;
Falta agora disposição política para alterar essa realidade, bem como para enfrentar as demais discussões que se fazem urgentes. A certeza que temos é precisamos reformar nosso pacto federativo, criando condições mais adequadas para o financiamento das políticas públicas e para a competitividade da economia brasileira.
Sem isso, continuaremos patinando e acentuando o conflito entre instituições e entre cidadãos.
* Co-idealizador do Projeto Brasil 2030, André Rafael é especialista em Políticas Públicas e Gestão Governamental.
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