Um dos nomes vetados pela Caixa, Felipe Neto questiona por que o governo se incomoda tanto com ele. Foto: Reprodução
O youtuber
Felipe Neto reagiu à
revelação feita pelo Congresso em Foco nessa sexta-feira (29) de que o seu nome consta da lista de 239 termos proibidos pela Caixa Econômica Federal de aparecerem em página na qual seja exibido o anúncio do banco. "É um dos maiores absurdos que já lidei nessa vida", classificou o youtuber, ao compartilhar nas redes sociais a reportagem do
site e anunciar que entrará na Justiça contra o veto ao seu nome. "Inacreditável", definiu.
Parlamentares da oposição também condenaram a posição da Caixa. Na relação de expressões vetadas publicada pela reportagem, constam, por exemplo, "Lula", "Jair Bolsonaro", "Congresso", "
abuso sexual", "
presidente da Caixa Econômica", "
cloroquina", "
covid", "
Marielle Franco", "
Paulo Guedes", "
Regina Duarte", "Itamaraty", "
fake news", "Amazônia", "
ditadura militar", "
Flávio Bolsonaro", "
Sergio Moro" e "
Dom Philips" (
veja a lista completa).
O veículo que descumprir a regra está sujeito a punições, como abatimento no valor a receber, suspensão da campanha publicitária ou outras sanções não especificadas pelas agências de publicidade contratadas.
O líder da minoria na Câmara,
Alencar Santana (PT-SP), chamou a censura imposta pelo banco à mídia de "AI-5 da Caixa". A medida foi implantada na gestão do ex-presidente da instituição Pedro Guimarães, demitido após
denúncias de assédio sexual e moral, mas é mantida pela nova administração. O deputado oposicionista vai entrar com uma representação contra a nova presidente do banco,
Daniella Marques, na próxima segunda-feira.
"Na segunda vou representar contra a presidenta da Caixa pelos ilícitos que a empresa cometeu ao impor censura e controle da imprensa através de contratos de publicidade, novo escândalo do governo Bolsonaro", afirmou.
O candidato a governador do Rio de Janeiro Marcelo Freixo (PSB-RJ) classificou o posicionamento da Caixa como "ilegal e antidemocrático". Para ele, o governo usa uma instituição pública para promover censura e intimidar seus adversários, como Felipe Neto. "Todos nós que defendemos a liberdade temos o dever de reagir a esse absurdo", afirmou.
A deputada
Fernanda Melchionna (Psol-RS) também criticou a medida: "Isso é ilegal, além de uma clara tentativa de suprimir as vozes democráticas pelo seus posicionamentos corretos em favor das liberdades democráticas. Conta comigo para todas ações contra esse absurdo".
Nos meios publicitários, a prática de estabelecer veto a expressões nas quais um anúncio é publicado é chamada de "blocklist" (do inglês lista de bloqueio). O expediente é usado por vários anunciantes para evitar que sua marca seja associada a determinados temas, tais como pornografia, acidentes graves, violência ou terrorismo. O que profissionais da área não estão acostumados a ver é um índex tão abrangente como o da Caixa.
O
Congresso em Foco procurou a assessoria da instituição ao longo da semana. Mas o banco só se manifestou na noite dessa sexta (29), após a publicação da reportagem. No comunicado, não há qualquer contestação à reportagem.
"A CAIXA esclarece que a medida mencionada é uma prática de mercado que visa tão somente a isenção e proteção da marca, preservando a imagem da instituição ao realizar sua inserção em conteúdos aderentes às estratégias mercadológica e negocial do banco e ao seu planejamento de marketing.
Destacamos que medidas de preservação da marca também constam em cartilha da Controladoria Geral da União (CGU) de 'Boas Práticas Aplicáveis à Utilização pela Administração Pública Federal', que orienta a adoção de 'Brand Suitability' quando essa exposição ocorre em contextos e conteúdos inadequados, abrangendo inclusive temas relacionados à política.
Ressaltamos, por fim, que a contratação de mídia publicitária é intermediada pelas agências de propaganda contratadas, conforme previsão contratual e o disposto na lei nº 12.232, de 29 de abril de 2010."
De acordo com o advogado Christian Thomas Oncken, a prática viola a Constituição Federal: "Temos uma restrição à liberdade de informação jornalística, uma censura. O artigo 220 do texto constitucional diz que nenhuma lei conterá dispositivo que possa constituir embaraço à plena liberdade de informação jornalística em qualquer veículo de comunicação social, e também veda toda e qualquer censura de natureza política, ideológica e artística".
A Associação Brasileira de Imprensa (ABI) também considerou a medida do banco público um claro exemplo de censura e cerceamento à liberdade do exercício do jornalismo e promete tomar providências em relação ao caso.
O
Congresso em Foco procurou a Secretaria Especial de Comunicação Social (Secom) do governo federal. Cabe ao órgão, vinculado ao Ministério das Comunicações, disciplinar e autorizar toda a publicidade feita pela administração direta e indireta da União. Não recebemos resposta da Secom até o momento.
Caixa usa publicidade para censurar mídia