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TRANSPORTE PÚBLICO
Congresso em Foco
30/3/2025 | Atualizado às 9:14
O Brasil registra um crescimento acelerado na adoção da tarifa zero no transporte coletivo por ônibus. Segundo levantamento da Associação Nacional das Empresas de Transportes Urbanos (NTU), 145 municípios oferecem gratuidade, parcial ou total, no sistema. Em 120 deles, o benefício é válido todos os dias e para toda a população. Nos demais, Ao todo, mais de 5,4 milhões de pessoas vivem em cidades com transporte gratuito integral (veja lista das cidades contempladas mais abaixo).
Esse avanço, mais intenso nos últimos cinco anos, representa uma mudança significativa no modelo de financiamento do transporte urbano, especialmente em municípios de pequeno porte: 61% das cidades com tarifa zero têm menos de 50 mil habitantes.
Expansão regional e progressiva
Em 2019, apenas 20 cidades adotavam a tarifa zero. Esse número cresceu sete vezes de lá para cá.. As regiões Sudeste (95) e Sul (34) lideram, seguidas pelo Nordeste (7), Centro-Oeste (6) e Norte (3).
Embora o assunto tenha ganhado projeção como bandeira das manifestações de junho de 2013, quando o mote "não é só pelos 20 centavos", do Movimento Passe Livre, desengatilhou atos país afora contra os reajustes das tarifas de ônibus, a primeira experiência com a gratuidade no transporte no Brasil foi registrada em 1992, no município paulista de Conchas, de 15 mil habitantes, localizado a 210 km de São Paulo.
Capitais testam gratuidade parcial
Embora predominante em cidades pequenas, o modelo começa a ser testado também em capitais, ainda de forma limitada. São Paulo, Maceió, Florianópolis, Palmas, Curitiba, Belo Horizonte, Brasília e São Luís adotaram gratuidade em dias específicos ou para grupos selecionados. O desafio para universalizar o benefício é maior nessas cidades devido aos altos custos envolvidos.
No Distrito Federal, desde o início de fevereiro o acesso aos ônibus é gratuito aos domingos e feriados. Em Curitiba, o benefício é voltado a pessoas desempregadas. Belo Horizonte oferece tarifa zero em linhas que atendem vilas e favelas. Florianópolis adota o modelo apenas no último domingo do mês. Em São Paulo, desde dezembro de 2023, o Domingão Tarifa Zero garante gratuidade dominical nos ônibus municipais, com custo anual estimado em R$ 283 milhões.
Os municípios destacam o acesso à mobilidade como principal razão para adotar o modelo, com foco em trabalhadores, estudantes e pessoas em situação de vulnerabilidade. Argumentam que a medida reduz desigualdades, melhora o trânsito e incentiva o uso do transporte coletivo.
Pauta crescente
A NTU afirma que 387 cidades brasileiras subsidiam o transporte público em todo o país. A entidade vê a gratuidade como uma alternativa viável, desde que acompanhada de planejamento, marcos regulatórios e separação clara entre a tarifa paga pelo usuário e a remuneração das empresas operadoras.
O presidente da NTU, Francisco Christovam, alerta que o aumento da demanda exige atenção ao custo operacional. "A gratuidade precisa ser implementada de forma gradual, por linhas ou períodos, afirmou ele ao Congresso em Foco. Não somos contra a tarifa zero, mas defendemos uma tarifa acessível. Sem planejamento, o sistema pode entrar em colapso", ponderou.
O tema ganhou destaque nas eleições municipais de 2024. Segundo o projeto Vota Aí, da Universidade de Campinas (Unicamp) e da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (Uer)j, o número de candidatos que mencionaram tarifa zero ou passe livre em seus programas saltou de 384, em 2016, para 675 em 2024.
Subsídios
Ao todo, 21 capitais e sete regiões metropolitanas possuem iniciativas de subsídios definitivos destinados ao transporte público por ônibus. No Brasil, em média, 32% do custo de remuneração do serviço é coberto por subsídio público.O restante é bancado pelos passageiros.
Entre as cidades com tarifa zero, o modelo de financiamento varia. Em Maricá (RJ), com 212 mil habitantes, por exemplo, o subsídio mensal é de R$ 7,3 milhões o maior registrado pela NTU. Já em cidades menores, como Caeté (MG), com 38 mil moradores, o gasto mensal gira em torno de R$ 90 mil, e em Araranguá (SC), de 72 mil habitantes, o valor anual chega a R$ 3,9 milhões.
Algumas cidades, como Vargem Grande Paulista (SP), adotaram um modelo em que empresas pagam uma taxa em substituição ao vale-transporte, ajudando a redistribuir os custos.
Efeito pandemia
A política de passe livre no transporte público ganhou maior força no Brasil da pandemia para cá. Até 2020, apenas 42 municípios ofereciam o benefício. O trabalho em casa mudou hábitos de consumo e mobilidade dos brasileiros. Muitas pessoas passaram a privilegiar as compras online e trabalhar de casa, por exemplo. Outras preferiram trocar os solavancos dos ônibus pela comodidade do transporte individual por aplicativos.
Em entrevista à BBC Brasil, o pesquisador Daniel Santini, autor de livros sobre o tema, aponta três fatores centrais para essa expansão. O primeiro é de ordem econômica: a queda no número de passageiros, agravada pela pandemia e pelo crescimento do transporte por aplicativo, expôs a fragilidade do modelo que remunera empresas por usuário transportado.
Segundo Santini, a tentativa das empresas de compensar a perda de receita elevando tarifas ou reduzindo a oferta de ônibus gera um efeito reverso. Mais usuários abandonam o sistema, criando um ciclo de queda e tornando o serviço ainda mais insustentável. Nesse contexto, até mesmo empresários passaram a apoiar a ampliação de subsídios e, em alguns casos, a adoção da tarifa zero em que o poder público cobre integralmente os custos.
O segundo fator é político, avalia. A gratuidade tem forte apelo popular e tende a garantir apoio eleitoral. A permanência da política, mesmo com mudanças de governo, reforça seu sucesso. De acordo com Santini, mais de 96% das cidades que adotaram a tarifa zero mantiveram a medida.
O terceiro efeito, perceptível em várias cidades, é prático: há aumento significativo no uso do transporte público, estímulo ao comércio local, maior arrecadação de impostos e melhoria no acesso da população a serviços essenciais como saúde e cultura.
Impacto no serviço
A mais recente Pesquisa de Mobilidade da Confederação Nacional do Transporte (CNT), divulgada em dezembro, revela que 58% da população das cidades com tarifa zero aprovam a gratuidade universal. Outros 28,7% preferem que o benefício seja direcionado a grupos específicos. Sobre os impactos, 56,7% notaram aumento na lotação dos ônibus, e as opiniões sobre a qualidade do serviço estão divididas: 34,8% acham que melhorou, enquanto 36,8% discordam.
A insatisfação com a segurança, o conforto e o preço das tarifas, além da expansão dos aplicativos de transporte individual, têm impulsionado um movimento silencioso: entre 2017 e 2024, 29,4% dos usuários deixaram de utilizar o transporte público, e 27,5% passaram a usá-lo com menos frequência. As principais queixas são falta de conforto (28,7%), horários rígidos (20,7%) e longos tempos de viagem (20,4%).
Apesar de 52,7% da população depender exclusivamente de ônibus, o sistema ainda sofre com falta de infraestrutura. Segundo a Associação Nacional de Transportes Públicos (ANTP), o Brasil precisa de 8.900 km adicionais de faixas exclusivas e corredores BRT para atender à demanda nas grandes cidades. Ainda assim, 60,7% dos passageiros aprovam essas soluções.
Emenda constitucional
Na Câmara, tramita a PEC 25/23, da deputada Luiza Erundina (Psol-SP), que propõe a criação do Sistema Único de Mobilidade (SUM). A proposta prevê transporte coletivo gratuito como direito constitucional, estruturado em diretrizes como universalidade, descentralização e financiamento solidário.
A ideia é criar condições de financiamento para bancar os custos do transporte da população, sem cobrança de tarifa do usuário, em todo o país, a exemplo do que ocorre com o Sistema Único de Saúde (SUS). Para garantir a sustentabilidade financeira do sistema, a proposta estabelece que o SUM será custeado por meio de percentuais definidos dos orçamentos públicos das três esferas de governo, além de uma nova contribuição pelo uso do sistema viário.
A PEC recebeu parecer favorável do relator, deputado Kiko Celeguim (PT-SP), na Comissão de Constituição e Justiça em dezembro de 2023, mas não foi incluída na pauta de votações no ano passado.
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