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Aldemario Araujo Castro
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Até a poupança revela a profunda desigualdade socioeconômica brasileira
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Microplásticos: pequenos demais para ver e numerosos demais para ignorar
04/11/2017 | Atualizado às 12h06
<< Deputados evangélicos inspecionam mostra sobre ditadura, e não encontram o que censurarOs possíveis condicionamentos ao amplo (mas não absoluto) direito de livre manifestação artística devem ser cuidadosamente encontradas nas normas (regras e princípios) e valores albergados na mesma Constituição que consagrou, corretamente, o direito de forma muito generosa. Nesse sentido, o disposto no art. 220 do Texto Maior precisa ser considerado. Esse comando está vazado nos seguintes termos: "A manifestação do pensamento, a criação, a expressão e a informação, sob qualquer forma, processo ou veículo não sofrerão qualquer restrição, observado o disposto nesta Constituição./§1º Nenhuma lei conterá dispositivo que possa constituir embaraço à plena liberdade de informação jornalística em qualquer veículo de comunicação social, observado o disposto no art. 5º, IV, V, X, XIII e XIV./§2º É vedada toda e qualquer censura de natureza política, ideológica e artística./§3º Compete à lei federal: I - regular as diversões e espetáculos públicos, cabendo ao Poder Público informar sobre a natureza deles, as faixas etárias a que não se recomendem, locais e horários em que sua apresentação se mostre inadequada; II - estabelecer os meios legais que garantam à pessoa e à família a possibilidade de se defenderem de programas ou programações de rádio e televisão que contrariem o disposto no art. 221, bem como da propaganda de produtos, práticas e serviços que possam ser nocivos à saúde e ao meio ambiente". Na linha posta por esse dispositivo constitucional, foram editadas a Lei n. 8.069, de 1990 (art. 74 e seguintes), a Lei n. 10.359, de 2001 (artigo terceiro) e a Lei n. 12.485, e 2011 (art. 11). Portanto, é perfeitamente cabível, até mesmo necessário, implementar a indicação informativa em relação às manifestações artísticas que possar causar algum tipo de constrangimento de cunho religioso ou alcançar crianças e adolescentes (em processo de construção da personalidade). É sempre importante frisar que cautelas de aviso ou eventual restrição de acesso não se confundem com censura ou proibição, claramente afastadas pela Constituição. No limite extremo, mediante intervenção judicial, seria possível a interdição de manifestações artísticas. Para tanto, uma análise cuidada de todo o contexto envolvido precisaria identificar uma inequívoca promoção de valores recusados claramente pelo constituinte. Não seria aceitável a expressão artística voltada para a promoção de discriminações (de raça, gênero, orientação sexual, etc), da violência e da criminalidade de forma geral. Não se trata, aqui, de repudiar a mera presença de elementos dessas temáticas. Trata-se de identificar casos raros e extremos de veiculações culturais que, por todo o contexto analisado, possuem a finalidade precípua de promover valores incompatíveis com aqueles consagrados na Constituição. Deve ser sublinhado que a utilização da nudez, da sexualidade, da violência e mesmo de elementos ligados às religiões não são motivos suficientes, tomados de forma isolada, para definição de condicionamentos ou limitações. Com efeito, a produção artística da humanidade ao longo dos séculos está recheada de exemplos de usos desses temas de todas as formas possíveis (provocativa, ingênua, explícita, velada, com extremo mau gosto, com leveza, etc). Ademais, são incontáveis, nos museus dos quatro cantos do mundo, as peças, de várias naturezas, que exploram essas temáticas. Um dos aspectos mais insólitos do debate em curso acerca da liberdade de manifestação artística é o enquadramento do mesmo como um embate entre o pensamento político de esquerda e o de direita. Nada pode ser mais inusitado e equivocado. O direito à liberdade de veiculação da produção artística é um desdobramento da liberdade de manifestação do pensamento. Tratam-se de direitos claramente de índole liberal. A Declaração de Direitos do Homem e do Cidadão, veiculada pela Revolução Francesa de 1789, proclamava (artigo 11): "A livre comunicação das ideias e das opiniões é um dos mais preciosos direitos do homem".
<< Fernanda Montenegro faz apelo a políticos contra censura: "Saiam do silêncio acovardado"Também deve ser anotada a existência de uma boa dose de hipocrisia na atuação dos atuais "moralistas" (ou "guardiões da moralidade da família brasileira", como provavelmente alguns querem ser conhecidos). A salutar liberalização dos costumes nas últimas décadas, fenômeno de âmbito mundial, tem viabilizado o crescente contato do público em geral, pelos mais variados meios, com intensas manifestações relacionadas com a nudez e a sexualidade. Aliás, ao longo dos séculos, a história da humanidade está marcada por milhares de registros artísticos nessas áreas, como antes anotado. Claro que cabe um debate sereno e responsável acerca da fixação de indicações classificatórias em veiculações de conteúdos dessas naturezas em meios de comunicação de massa ou espaços abertos ao público. Não deve ser confundida, entretanto, essa discussão construtiva com a sanha moralista, proibicionista e hipócrita de grupos e setores movidos por uma lógica quase medieval. O debate em torno das manifestações artísticas também é alimentado por interesses político-ideológicos bem definidos. Certos setores e grupos da sociedade brasileira perseguem dois claros objetivos com as iniciativas referidas. Em primeiro lugar, buscam desviar a atenção de largos setores da sociedade para longe do mar de lama comprometedor do atual Presidente da República, vários de seus ministros e boa parte de sua base de sustentação político-parlamentar. Em segundo lugar, procuram capitanear e capitalizar uma disputa em torno de valores e costumes no seio da sociedade. Nessa última perspectiva, se apresentam como defensores do que existe de mais atrasado e retrógrado no convívio humano, falsamente rotulados como valores "da família" ou das pessoas "de bem".
<< Do mesmo autor: Aplicação de medidas cautelares penais a parlamentar: uma exigência do Estado Democrático de Direito
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