Bancada do PT considera que falta consenso em questões como a rastreabilidade de produtores de conteúdo e penas para produção de fake news. [fotografo]Reprodução[/fotografo]
Qualquer marqueteiro responde na ponta da língua qual é o maior adversário numa campanha. Não dirá que é o concorrente, como seria óbvio, mas o tempo.
Administrar o tempo, ter boa noção de "
timing", dosar na propaganda eleitoral as mensagens propositivas, de ataque ou de defesa, conforme o humor do eleitorado, são as principais responsabilidades do bom profissional de marketing. Ele desenvolve um faro, um
feeling, um instinto, a partir da experiência e da atenção que dá a TODOS os movimentos, internos ou externos, durante uma campanha.
Esse faro tem outros ingredientes, como a compreensão exata do momento político em que a campanha ocorre, e dos acontecimentos locais, estaduais, nacionais e até internacionais que mais se destacam no noticiário. Tudo influencia os rumos de uma campanha, e precisa ser considerado na definição da estratégia. O bom profissional de marketing sabe que a campanha precisa estar sintonizada com seu entorno e com seu momento, sob pena de jogar pérolas aos porcos. E pilotar bem o tempo, para não chegar na reta final pedindo água.
Estrago feito, efeito na urna
Pois é justamente na desorganização do tempo do adversário que as "fake news" apostam. São capazes de destroçar uma campanha vitoriosa, que vinha empinada mas de repente pode enfiar a cara no chão. Se uma "fake" for disparada na reta final, faltará tempo para ser desmentida e neutralizada. Estrago feito, efeito na urna.
Até agora, todos os projetos em andamento para enfrentar as "fake news" atuam topicamente. Nenhum tem poder de conter a devastação, seja neutralizando os mísseis de mentiras, seja corrigindo os estragos, seja indiciando e punindo os responsáveis. Lá no futuro, quando for feito um levantamento do fato mais relevante do Século 21, o fenômeno das "fake news" estará no topo das citações. E provavelmente, lá no futuro, elas ainda estarão fazendo estragos à democracia e às reputações.
Mas, mesmo no deserto de ideias para tentar emparedar as "fakes", começam a pingar iniciativas que merecem destaque. A primeira é o surgimento de institutos de confirmação como a Lupa, que funciona num site permanentemente alimentado com a verificação dos teores de verdade e de mentira contidos em discursos parlamentares, artigos, declarações e manifestações de líderes políticos e econômicos de todos os matizes.
Claro que não tem nem pretende ter a amplitude de cobertura capaz de abarcar o oceano de versões, contraversões, assertivas e desmentidos em circulação, a fim de aferir sua veracidade. Ainda assim, iniciativas como a da Lupa merecem saudação especial pela relevância do trabalho que vem realizando em favor da verdade e da democracia, os quais precisam ser massificados cada vez mais para que seus efeitos sejam amplificados. Órgãos de imprensa, acordem e se associem a uma lupa dessas. A credibilidade agradece.
Instituições, saiam da zona de conforto!
Outra iniciativa, ainda tímida, é a de instituições sérias, públicas e privadas, usarem sua própria confiabilidade para desmentir mentiras em circulação. No caso das instituições públicas, essa confiabilidade decorre de sua condição de fonte primária. Até agora poucas instituições parlamentares, do executivo e do mundo jurídico já disponibilizam espaços próprios e fixos em seus sites e portais para a publicação periódica de desmentidos sobre "fakes" que lhes digam respeito. Se começassem a fazer isso em escala maior estariam estabelecendo importante contraponto ao tsunami de mentiras fabricadas e destinadas, sem exceção, ao ataque a pessoas e instituições.
Imagine-se a relevância do serviço que tais organizações poderiam prestar disponibilizando tais informações. Uma instituição como o Senado, por exemplo, poderia disponibilizar em espaço próprio de seu portal um "
A Verdade do Senado", para desmentir mentiras que correm na velocidade da luz pelos canais da internet distorcendo fatos, demolindo reputações, semeando ódio, preconceito e intolerância. E dá pra fazer isso de forma simples. Pode publicar a cada boato que lhe diga respeito um informe que reponha a verdade em seu lugar. Se o boato fala de um projeto aprovado na calada da noite, pode simplesmente dizer que não existem sessões secretas, e sim votações secretas. Logo não existem votações na calada da noite e, portanto, a informação é mentirosa.
Que tal desinventar a internet?
Tais iniciativas resolverão o problema? De forma alguma. O boato é milhares de vezes mais rápido do que o desmentido. Vai demorar até se descobrir um antídoto eficaz contra essa peçonha. "Fake news" são um mal duradouro, que só seria realmente neutralizado se se desinventasse a internet. Tal possibilidade não cabe na mais delirante criação de um Júlio Verne de nosso tempo. O jeito é ir tentando tudo o que for possível pra reduzir os estragos. Como se diz no meu Nordeste, contra a praga planetária das "fake news" qualquer coisa que se faça já é melhor do que diabo de nada.