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LEGIS-ATIVO
12/3/2025 16:52h
Um sistema democrático saudável possui pelo menos três pontos de veto: a burocracia, o Poder Legislativo e o Poder Judiciário. Engana-se quem vota para chefe de Governo e acredita que ele poderá fazer tudo o que quiser. Até mesmo sistemas democráticos majoritários como os do Reino Unido, Austrália e Nova Zelândia têm pontos de veto. Isso se deve, principalmente, ao que aconteceu com a Alemanha pré-nazismo onde um sistema totalmente majoritário sucumbiu à hiper maioria do partido nazista quando foi eleito democraticamente e, aos poucos, mudou diversas regras do jogo empurrando aquele país para os anos mais obscuros de sua história.
Após a derrota na Segunda Guerra, as reformas subsequentes trataram de empoderar o Judiciário e criar pontos de veto para que nenhum governante, por mais que tivesse maioria no Parlamento, pudesse implementar sua agenda sem obstáculos.
Os Estados Unidos estão passando por esse problema neste momento. O presidente, além de ter vencido no Colégio Eleitoral, também venceu no voto popular, obtendo mais legitimidade política. Além disso, o seu partido detém a maioria absoluta das duas casas do Congresso. Entretanto, algumas reformas necessitam de maioria qualificada, o que exigiria apoio bipartidário para essa agenda, por superar e muito a maioria tênue que possui no Legislativo. Além disso, a burocracia (em que pesem as duras inserções do Executivo) tem conseguido algumas vitórias via Judiciário Federal e, posteriormente, Suprema Corte.
Alguns críticos do presidencialismo, como Juan Linz, diriam que essa dificuldade de implementar a agenda seria um percalço do sistema. Porém o sistema democrático não significa fazer o que se quer, mas o que é possível diante da diversidade sociopolítica das demais instâncias de poder. Recentemente no Brasil, o presidente Lula teve alguns embates com o Instituto Brasileiro de Meio Ambiente (Ibama). Técnicos do órgão se opuseram à extração petrolífera na bacia do Equador (próximo à costa do Amapá, Pará e Maranhão). Como a legislação determina autorização desse órgão, esse foi o primeiro veto à agenda do governo e da Petrobras de exploração petrolífera na área.
Esse poder de veto só é possível graças a uma burocracia formada por servidores concursados e estáveis. A estabilidade é ponto fundamental para a proteção de decisões técnicas que não podem ser revistas mediante ameaça de demissão. Foi assim que a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) aprovou as vacinas contra a covid-19 quando o governo desdenhava de sua eficácia e sugeria medicação alternativa sem evidência científica.
Mas além de uma burocracia forte, O Legislativo também tem um papel extremamente importante nos vetos impostos ao Executivo. Quem leu até aqui deve ter se perguntado o porquê de eu não ter colocado o Executivo como ponto de veto. É que apesar de poder vetar boa parte do que vem do Legislativo, seus vetos podem ser derrubados pelo Congresso, tornando essa casa o verdadeiro ator com poder de veto. Como o Brasil é diverso e possui realidades distintas do ponto de vista regional, social e econômico, isso se manifesta de alguma forma tanto na Câmara dos Deputados quanto no Senado, obrigando o governo a negociar o tempo todo.
Para quem votou no incumbente do Executivo, o Congresso é um infortúnio, para quem votou no perdedor, o Legislativo é um alento. Mas nem sempre funciona assim. No governo Lula III o Congresso tem se mostrado difícil e pouco cooperativo, e isso é um reflexo da pouca articulação política que o governo tem conseguido fazer com o Legislativo. Já no governo Bolsonaro, o Congresso foi extremamente complacente deixando de lado seu papel de ator com poder de veto. Foi nesse momento que entrou o Judiciário.
Tanto a burocracia quanto partidos políticos de oposição acionaram a Justiça para barrar propostas sem base legal e que feriam princípios democráticos e republicanos, impondo perdas significativas ao governo da época. Isso trouxe o Judiciário para os holofotes, desenvolvendo nos eleitores uma relação de amor e de ódio.
Muitos não entendem que a Suprema Corte é uma instituição política e que não poderia ser diferente, do contrário estaríamos sob a égide de uma tecnocracia. Mas é inegável que ao adentrar em temas políticos extremamente sensíveis, o STF atraiu para si uma grande responsabilidade política por buscar trazer, de alguma forma, estabilidade ao caos institucional que se buscava instalar no governo anterior.
Se o Legislativo não tivesse renegado seu papel, o STF poderia ter sido poupado das intervenções judiciais que precisou fazer. Entretanto, apesar de muitos críticos e de alguns cientistas políticos que pouco entendem do assunto acharem uma anomalia, o STF e as demais instituições políticas brasileiras tem demonstrado uma maturidade muito forte, sendo desnecessário implementar mudanças de qualquer natureza como parlamentarismo ou semi-presidencialismo. Do ponto de vista da evolução das instituições, muitas mudanças em curto espaço de tempo mais atrapalham do que ajudam o sistema político. É preciso saber jogar sob as regras e aceitar os percalços e as derrotas, e não buscar mudá-las sempre surgirem infortúnios.
O texto acima expressa a visão de quem o assina, não necessariamente do Congresso em Foco. Se você quer publicar algo sobre o mesmo tema, mas com um diferente ponto de vista, envie sua sugestão de texto para [email protected]
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