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Mundo
8/3/2025 12:33
O mais importante espetáculo do ano não ocorreu no tapete vermelho de Hollywood, mas sim no tapete do Salão Oval da Casa Branca, no lamentável episódio protagonizado pelo presidente americano, Donald Trump, e pelo presidente ucraniano, Volodymir Zelensky. Cumpre reconhecer, em favor do atual mandatário dos Estados Unidos, que ofuscar a entrega dos Oscars é, sem dúvida, uma conquista notável. No entanto, também é verdade que o embate rasteiro entre dois Chefes de Estado é um fato inédito nas relações internacionais contemporâneas.
Menciono isso com propriedade, pois fui intérprete oficial do presidente da República do Brasil entre 2003 e 2010. Naquela época, participei de dezenas de encontros alguns bastante tensos e difíceis mas jamais de nível tão grosseiro e desrespeitoso entre mandatários como este que o mundo presenciou há pouco. A Casa Branca já viveu dias melhores.
Uma visão precipitada poderia afirmar que Trump é o incontestável vencedor de todas as categorias possíveis de Oscar, considerando a reviravolta brutal que impôs às relações internacionais. Em artigo anterior, logo antes da posse do atual presidente dos EUA, já havia antecipado o fim do multilateralismo como o conhecemos desde 1944, quando a Conferência de Bretton Woods fundou os principais organismos multilaterais na área financeira (Banco Mundial, FMI) e a Conferência de São Francisco criou a ONU.
Posteriormente, surgiram a Organização Mundial do Comércio e uma série de agências e organizações orientadas para a criação de um mundo multilateral, onde as nações mais fracas economicamente e, sobretudo, militarmente, teriam voz no cenário global, sob a crença de que isso promoveria um mundo mais justo e livre de conflitos.
Essa ilusão pacifista, no entanto, fracassou. Conflitos armados se multiplicaram tanto durante a Guerra Fria quanto após a implosão da União Soviética em 1991. E progressivamente voltamos a um mundo bilateral, onde os mais fortes impõem suas vontades. O que é assustador nesse novo bilateralismo é a proliferação da arma nuclear. Não é preciso ser um gênio para afirmar que, quanto mais países possuírem ogivas nucleares, maior o risco de um conflito sair do controle e essas armas serem efetivamente usadas. E estamos, de fato, testemunhando uma nova corrida armamentista impulsionada pela guerra na Ucrânia.
O passado recente já assistiu a duas grandes escaladas militares na Europa: uma desde o final do século XIX até a eclosão da Primeira Guerra Mundial, com o Império Alemão e a Grã-Bretanha como principais protagonistas. A carnificina dessa guerra sangrou a Europa e permitiu o surgimento de uma nova potência mundial: os Estados Unidos, até então um ator regional.
Após isso, houve uma tentativa de criar um mundo onde desastres como aquele não se repetissem. Sob a liderança dos Estados Unidos, a nova potência mundial, foi criada a Sociedade das Nações, precursora da ONU. No entanto, disputas políticas internas impediram os EUA de se juntarem à organização à qual o presidente americano havia instado países europeus, como o Reino Unido de Winston Churchill e a França de Clemenceau, a aderirem.
Apesar da ausência americana na recém-criada organização de paz, os ventos pareciam indicar uma era de calma, reforçada pelo pacto Briand-Kellogg, que tornava ilegal recorrer à guerra como resolução de conflitos. Uma doce, mas fugaz, ilusão, que desmoronou devido à frustração italiana por não ter sido recompensada no final da Primeira Grande Guerra, ao ressentimento alemão em relação às cláusulas draconianas do Tratado de Versalhes e ao imperialismo japonês na Ásia. Isso resultou em mais uma disputa bélica, impulsionada pelo então III Reich alemão, com a Itália fascista e o Japão militarista também na jogada. E isso conduziu a uma carnificina ainda maior: a Segunda Guerra Mundial.
Essa dinâmica de rearmamento seguido de conflitos de grandes proporções está de volta ao cenário atual, agora com o agravante da ameaça nuclear. Vale lembrar que, antes desses dois grandes conflitos, os EUA adotaram uma política isolacionista, concentrados no desenvolvimento de um capitalismo impulsionado por mercados globais uma prática longe de ser novidade. Tampouco surpreende a agressividade de uma potência frustrada por ter perdido poder e influência no cenário internacional, como é o caso da Rússia de hoje.
O Império Russo sempre foi expansionista e beligerante, e continuamente carregou um medo atávico de ser invadido um temor plenamente justificado, aliás, basta estudar a história russa. O povo russo está acostumado a fazer enormes sacrifícios, em vidas humanas e bem-estar, para salvar a Pátria Mãe de qualquer agressão, seja concreta ou imaginária. Isso, em parte, explica a guerra na Ucrânia e o absurdo aparente de o maior país do mundo buscar conquistar mais territórios.
Agora, voltemos ao histriônico Donald Trump e sua política de "Make America Great Again" (MAGA), que não passa de uma mistura de isolacionismo com um bilateralismo em sua versão mais brutal, à la "reality show de UFC". Aqueles que hoje celebram essa suposta eficácia empresarial, apoiada por magnatas tecnológicos, acabarão se decepcionando com os resultados, pois os princípios que regem uma empresa privada são diversos dos da administração pública, que tem funções e finalidades bem diferentes.
Mas, voltando ao Oscar: nem Trump nem Putin poderiam ganhar estatuetas, a menos que fossem criadas categorias como "Melhor Ator Canastrão" e "Melhor Vilão". A política MAGA é de tal insensatez que, na verdade, deveria ser chamada de MASA (Make America Small Again). Um exemplo claro disso é a extinção da USAID, a agência de ajuda humanitária para os países mais pobres do mundo. O custo anual dessa agência, em 2024, foi de 40 bilhões de dólares. Uma fortuna, não é mesmo? Porém, aliviar o fardo do contribuinte americano representaria apenas 0,6% do orçamento uma quantia que mal fará diferença internamente.
Em contrapartida, os EUA sofrerão uma perda significativa de imagem e influência em vários países e, o mais crítico, deixarão uma lacuna na assistência aos mais necessitados. Esquecem-se de que, na política, vácuos não ficam desocupados por muito tempo.
E é por isso que o grande vencedor do Oscar em todas as categorias possíveis é: Xi Jinping, presidente da República Popular da China. A China já adota uma política assertiva no mundo, com iniciativas como a "Nova Rota da Seda". Para o orçamento chinês, 40 bilhões de dólares são uma ninharia. O mais importante é ocupar o espaço que os Estados Unidos demoraram décadas para construir junto aos países em desenvolvimento. E, melhor ainda, sem conflitos, sem atritos, sendo recebido com flores e efusivos agradecimentos.
Assim, MAGA se transforma, de fato, em MCGA: Make China Great Again! Lembremos que, na história da civilização, a China ocupou uma posição preeminente, representando, conforme várias avaliações, cerca de 30% do PIB mundial. Sua decadência durou apenas um século, e hoje ela está retomando o lugar que ocupou por milênios.
Com a inesperada ajuda dessa política MAGA, a República Popular da China acaba de ganhar, de bandeja, uma oportunidade ímpar para expandir sua influência no mundo. Conforme o ideograma chinês, crise e oportunidade compartilham a mesma representação gráfica. Sob a égide dessa premissa, tempos interessantes nos aguardam.
O texto acima expressa a visão de quem o assina, não necessariamente do Congresso em Foco. Se você quer publicar algo sobre o mesmo tema, mas com um diferente ponto de vista, envie sua sugestão de texto para [email protected].
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