Em discurso em Nova York, Lula cobra mais ousadia e reforma da ONU
Evento vai até segunda (23) e antecede a 79ª Assembleia Geral da Organização das Nações Unidas, quando Lula discursará
Congresso em Foco
22/09/2024 | Atualizado às 07h43
A-A+
COMPARTILHE ESTA NOTÍCIA
Lula abrirá nova assembleia geral da ONU. Foto: Ricardo Stuckert/PR
O presidente Lula participou, neste domingo (22), da abertura da Cúpula do Futuro. O evento antecede a 79ª Assembleia Geral da Organização das Nações Unidas, em Nova York, e vai até a segunda (23). Durante o discurso, Lula excedeu o tempo e teve o microfone cortado. O presidente cobrou mais "ambição e ousadia" no debate entre os líderes mundiais.
"Os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável foram o maior empreendimento diplomático dos últimos anos, e caminham para se tornar o nosso maior fracasso coletivo. No ritmo atual de implementação, apenas 17% das metas da Agenda 2030 serão atingidas dentro do prazo", pontuou o presidente, em seu pronunciamento de cinco minutos, tempo máximo para cada país.
Lula destacou avanços no Pacto pelo Futuro, documento aprovado durante o evento com compromissos com mudanças no sistema multilateral, incluindo temas como o desenvolvimento sustentável, paz e segurança internacional, criticou a ausência de reformas em instituições como a própria ONU.
"Todos esses avanços serão louváveis e significativos, mas ainda assim, nos falta ambição e ousadia. A crise da governança global requer transformações estruturais. A pandemia, os conflitos na Europa e no Oriente Médio, a corrida armamentista e a mudança do clima escancaram as limitações das instâncias multilaterais", declarou.
Lula observou que órgãos internacionais carecem de "autoridade e meios de implementação para fazer cumprir suas decisões". "A Assembleia Geral perdeu sua vitalidade e o Conselho Econômico e Social foi esvaziado. A legitimidade do Conselho de Segurança encolhe a cada vez que aplica duplos padrões ou se omite diante de atrocidades", observou o presidente.
Lula também discursará na abertura da 79ª Assembleia Geral da Organização das Nações Unidas nesta terça-feira (24). É uma tradição que o Brasil abra os discursos da Assembleia Geral da ONU, desde a 10ª edição, em 1955. Entre os temas que devem ser abordados pelo presidente está o enfrentamento às mudanças climáticas, frente às queimadas que atingem a Amazônia, o pantanal e o cerrado, e o combate à fome.
Além do presidente, acompanham a agenda na ONU a primeira-dama, Janja da Silva; o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG); os ministros Mauro Vieira, das Relações Institucionais, e Marina Silva, do Meio Ambiente; e o assessor especial de Lula e ex-chanceler Celso Amorim.
Leia o discurso preparado por Lula para a Cúpula do Futuro da ONU:
"Agradeço ao Secretário-Geral António Guterres pela iniciativa de promover esta Cúpula do Futuro.Cumprimento a Alemanha e a Namíbia, por meio do chanceler Olaf Scholz e do presidente Nangolo Mbumba, por conduzirem o processo que nos trouxe até aqui.Há quase vinte anos, o então Secretário-Geral Kofi Annan nos convidou a pensar em como revigorar o multilateralismo para fazer frente aos desafios do novo milênio.Naquela ocasião, ressaltei nesta tribuna a necessidade de reformas para que a ONU pudesse cumprir seu papel histórico.Aquela reflexão conjunta rendeu frutos como a Comissão de Consolidação da Paz e o Conselho de Direitos Humanos.Outras ideias não saíram do papel.Temos duas grandes responsabilidades perante aqueles que nos sucederão.A primeira é nunca retroceder.Não podemos recuar na promoção da igualdade de gêneros, nem na luta contra o racismo e todas as formas de discriminação.Tampouco podemos voltar a conviver com ameaças nucleares.É inaceitável regredir a um mundo dividido em fronteiras ideológicas ou zonas de influência.Naturalizar a fome de 733 milhões de pessoas seria vergonhoso.Voltar atrás em nossos compromissos é colocar em xeque tudo o que construímos tão arduamente.Os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável foram o maior empreendimento diplomático dos últimos anos e caminham para se tornarem nosso maior fracasso coletivo.No ritmo atual de implementação, apenas 17% das metas da Agenda 2030 serão atingidas dentro do prazo.Na presidência do G20, o Brasil lançará uma Aliança Global contra a Fome e a Pobreza para acelerar a superação desses flagelos.Na COP28 do Clima, o mundo realizou um balanço global da implementação das metas do Acordo de Paris.Os níveis atuais de redução de emissões de gases do efeito estufa e financiamento climático são insuficientes para manter o planeta seguro.Em parceria com o Secretário-Geral, como preparação para a COP30, vamos trabalhar por um balanço ético global, reunindo diversos setores da sociedade civil para pensar a ação climática sob o prisma da justiça, da equidade e da solidariedade.Nossa segunda responsabilidade comum é abrir caminhos diante dos novos riscos e oportunidades.O Pacto para o Futuro nos aponta a direção a seguir.O documento trata de forma inédita temas importantes como a dívida de países em desenvolvimento e a tributação internacional.A criação de uma instância de diálogo entre Chefes de Estado e de Governo e líderes de instituições financeiras internacionais promete recolocar a ONU no centro do debate econômico mundial.O Pacto Global Digital é um ponto de partida para uma governança digital inclusiva, que reduza as assimetrias de uma economia baseada em dados e mitigue o impacto de novas tecnologias como a Inteligência Artificial.Todos esses avanços serão louváveis e significativos.Mas, ainda assim, nos faltam ambição e ousadia.A crise da governança global requer transformações estruturais.A pandemia, os conflitos na Europa e no Oriente Médio, a corrida armamentista e a mudança do clima escancaram as limitações das instâncias multilaterais.A maioria dos órgãos carece de autoridade e meios de implementação para fazer cumprir suas decisões.A Assembleia Geral perdeu sua vitalidade e o Conselho Econômico e Social foi esvaziado.A legitimidade do Conselho de Segurança encolhe a cada vez que ele aplica duplos padrões ou se omite diante de atrocidades.As instituições de Bretton Woods desconsideram as prioridades e as necessidades do mundo em desenvolvimento.O Sul Global não está representado de forma condizente com seu atual peso político, econômico [neste ponto, o microfone foi cortado e Lula encerrou a fala] e demográfico.A Carta da ONU não faz referência à promoção do desenvolvimento sustentável.Precisamos de coragem e vontade política para mudar, criando hoje o amanhã que queremos.O melhor legado que podemos deixar às gerações futuras é uma governança capaz de responder de forma efetiva aos desafios que persistem e aos que surgirão.Muito obrigado."