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Congresso em Foco
18/10/2007 | Atualizado 21/10/2007 às 0:00
Cláudio Versiani, de Nova York*
Aqui em Nova York tenho uns homeless. Tenho é modo de dizer. Existem uns homeless que ficam aqui por perto de casa. Dormem ali ou acolá e vão levando a vida. São conhecidos da vizinhança. Desaparecem de um dia para outro e reaparecem num dia qualquer. Voltam de banho tomado, cabelo cortado e roupa nova. A prefeitura recolhe os sem-tetos de tempos em tempos. Passam uma temporada nos abrigos, mas não podem ficar lá para sempre. Retornam então para a rua, que é a casa deles. É uma vida triste, são desajustados. Mas os homeless fazem parte da paisagem novaiorquina e são uma face da cultura norte-americana (leia mais na nota de rodapé).
São Francisco, na Califórnia, é o lugar onde os desajustados lançaram o seu grito “beat” de guerra. A metrópole é uma Nova York calma e relaxada. O estado da Califórnia tem o oitavo PIB do planeta. Nos anos 60 surgiram os hippies. O movimento passou, mas alguns ainda estão por lá, perdidos no tempo e no espaço. Hoje sobraram os homeless e muitos yuppies. Gente que faz grana, mas que ao mesmo tempo quer gozar a vida.
Os “garotos” do Google são exemplos de gente que brinca de fazer negócio e ao mesmo tempo aproveita a vida. Além de ser uma das empresas mais valiosas do planeta terra, o Google é certamente um dos melhores lugares para se trabalhar no mundo. Quem não quer desempenhar suas funções profissionais de bermuda ou outra roupa qualquer? Não ter horário e ainda por cima ter um restaurante na empresa comandado por “super chefs”. E sem chefe cobrando produção. O Google é só um dos exemplos. Bill Gates poderia ser outro. Outra face conhecida da Califórnia é a da produção de vinhos, muito bons por sinal, principalmente os caros. E são caros de verdade. E mais caros que bons vinhos franceses, o que revela que os californianos são bons de marketing também.
Uma visita aos vales de Napa e Sonoma é para lavar a alma, molhar a garganta, deleitar o chamado néctar dos deuses e entender um pouco do California way of life. Na cidade de Napa não tem muita coisa para se fazer, parece mesmo uma cidade americana do interior. Às 21 horas já está morta. Já Sonoma é uma festa, quase uma farra. Até a polícia é mais tranqüila. As pessoas bebem na rua e nos parques e os policiais fingem que não vêem a transgressão. Muita música ao ar livre, bons restaurantes, muitos bares e gente feliz por todos os lados. Como se diz, dinheiro não traz felicidade, mas ajuda um bocado.
De volta a San Fran – como escrevia Jack Kerouac ou Frisco, para os íntimos (não é o meu caso) – vou visitar o Museu Beat. Compro um On the road, já que estou na estrada mesmo. Vou tentar dar uns “kicks” na Rota 66, como cantou Nat King Cole, e como fez Kerouac, nos anos 50.
Jack Kerouac é o ícone da “geração beat”. Eles nasceram nos tempos da grande depressão. Tinham 15 anos na Segunda Guerra e entraram na vida adulta quando os EUA estavam se transformando em um país rico. Muita mudança em 20 anos.
Kerouac vivia em Nova York, mas sua direção era o oeste. Ele atravessava o país de carona, carro, caminhão, ônibus ou trem. Era em São Francisco que ele fazia sua cabeça. Acabou fazendo a cabeça de um país e ajudou a mudar o mundo. Foi um dos baluartes da chamada contra-cultura dos anos 60. Na América pós-guerra ele rejeitou os valores e o comportamento social dos anos 50. Escreveu o famoso On the road enquanto viajava de um lado para outro. Ele dizia que o primeiro pensamento é o melhor pensamento.
O livro é um diário desordenado da desorganizada vida do autor. Esqueça as regras, inclusive as da escrita. São parágrafos enormes com uma pontuação subversiva e com uma psicodélica riqueza de detalhes. O livro é uma profecia, é a busca do significado da vida enquanto ele vivia e viajava. Nada de esperar a próxima vida.
James Dean, outro ícone dos anos 50, disse: “Sonhe como se você fosse viver eternamente, viva como se você fosse morrer hoje”. Dean morreu em um acidente automobilístico aos 24 anos de vida. Kerouac viveu um pouco mais. Morreu aos 47 anos de hemorragia interna. Ele viveu seus sonhos embalado por álcool e várias outras drogas, principalmente as ilícitas. Jack Kerouac é a personificação da busca da felicidade como o maior bem da vida.
Ele escreveu, numa tradução livre, algo assim: “Numa tarde eu entrei na igreja da minha infância e tive uma visão do que realmente significava ‘beat’… a visão da palavra ‘beat’ passando a significar felicidade… pessoas começaram a se chamar de beatniks, beats, jazzniks, bopniks, bugniks e, finalmente, fui chamado de o ‘avatar’ (encarnação) de tudo isso”.
O livro foi escrito em 1951, publicado em 1957 e a palavra beatnik apareceu pela primeira vez no jornal San Francisco Chronicle em 1958. Os EUA estavam assustados com o lançamento do satélite russo Sputnik. E fazia parte do assombro a revolução cultural que estava só começando. Os anos 60 estavam logo ali. O país fervia, os negros reclamavam seus direitos. A guerra do Vietnã estava por começar e os hippies iriam virar a América do Norte de pernas para o ar.
Saio do museu e me informo onde é a casa de Janis Joplin. O sujeito me diz aonde é, mas faz uma ressalva: ela não mora mais lá (sic). Desisto, está quase na hora de embarcar para Vancouver. Deixo para trás os homeless de San Fran e a felicidade de estar na terra de Kerouac e Joplin.
A cidade de Vancouver é chata e sem charme. Muito perto dos EUA e longe do Canadá. Cheia de McDonalds e Burger Kings. Fico chocado com os homeless de lá. Em São Francisco, os sem-teto são organizados, amigáveis, catam latas, fumam maconha e tomam suas drogas, tudo ao ar livre. Reúnem-se, jogam xadrez, lêem jornal e não perturbam ninguém.
Em Vancouver são agressivos e perigosos, a avenida em que ficam e sobrevivem é terra de ninguém. Tento passar por lá e um garoto de uns 20 anos, um dos homeless, me avisa que vão me tomar a câmera fotográfica. Dou meia volta, melhor ver da janela do ônibus. Ou melhor, não ver, porque a cena é degradante. Pessoas no último estágio da deterioração. Alguns são deformados fisicamente e se arrastam pelas ruas (veja foto abaixo).
Felizmente o tempo passa rápido, hora de conhecer o Alaska, o lugar mais bonito do mundo. Mas isso é assunto para uma outra coluna. Próxima parada, Anchorage.
Nota: não se sabe ao certo o número de homeless nos EUA, mas organismos do governo calculam que existam pelo menos 3,5 milhões deles no país. Em Nova York, são perto de 40.000. Cerca de 40% dos sem-teto passaram pelas Forças Armadas e 22% apresentam problemas psiquiátricos.
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