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Congresso em Foco
18/03/2018 | Atualizado às 23h40
<< Comoção e grito contra a violência marcam adeus à vereadora Marielle Franco; veja os vídeos << Há um ano Marielle Franco denunciou racismo no aeroporto de Brasília: "Vasculharam até meu cabeloDiante da pluralidade de opiniões que ganhou o noticiário nos últimos dias, e da montanha de dúvidas erguida no país a partir do assassinato - ou execução, principal linha de investigação das polícias do Rio -, o Congresso em Foco publica sua contribuição para o debate. Em um contexto de desinformação de parcela da população e do câncer das notícias falsas espalhadas em redes sociais, profissionais e estudiosos das mais diversas áreas e tendências ideológicas foram ouvidos pela reportagem e aqui registram suas opiniões. Para o professor da Universidade de Brasília (UnB) e mestre em Ciência Política Ricardo Caldas, o assassinato não terá qualquer efeito sobre as votações nacionais, e não abala a intervenção que o presidente Michel Temer (MDB) decretou na segurança pública do Rio. "Pelo contrário. Acho que até pode ter um efeito oposto, que é justamente o de reforçar o discurso do governo pela segurança, pela intervenção", diz o acadêmico. "Por mais paradoxal que seja, o assassinato dela reforça a tese do governo de que o Rio está sem segurança." Para Ricardo, sequer a imagem do Exército, cujos comandantes são os interventores, sofrerá abalo em decorrência do crime. "Não importa. Não existe instituição perfeita. Nem a Polícia Militar, nem o Exército, nem a Polícia Federal, nem a Polícia Civil. Todas elas são limitadas. A busca por segurança não é perfeita, sempre vai haver crimes não resolvidos", acrescenta o professor, autor de livros sobre políticas públicas, globalização e cultura. O morro que desce Mas o geógrafo do Conselho Indigenista Missionário (Cimi) Gilberto Vieira dos Santos vê o quadro da intervenção sem a mesma importância. Para Gilberto, a política de mercado de Temer e a própria intervenção são exemplos do "contexto de golpe" ao qual a população está submetida. "É uma intervenção militar num governo de caráter subserviente, entreguista (pré-sal, Petrobras, Base de Alcântara). Até agora o que vimos da intervenção foi uma sequência de violações, crianças revistadas, pessoas sendo fotografaras com seus documentos. Enquanto isso, nada de efetivo. Apesar de, na boca miúda, até os pipoqueiros da praia sabem onde chagam as armas no porto", diz Giberto, mestrando em Desenvolvimento Territorial na América Latina e no Caribe e membro do Centro de Estudos de Geografia do Trabalho da Universidade Estadual Paulista (Unesp). Lembrando que Marielle foi designada como relatora das comissões que vão acompanhar a intervenção, Gilberto destaca que a vereadora era não só mulher em uma sociedade patriarcal e machista, mas também "negra, favelada e com postura". "Não abaixou a cabeça como quer a secular elite branca. Aquela mesma que critica políticas de ações afirmativas e cotas raciais. Ela era a expressão do moro 'que desce', a senzalas questionando a casa grande e transitando no espaço 'próprio' desta elite", disparou o geógrafo indigenista.
<< Depois de postar fake news com acusações a Marielle, Fraga diz que "esquerda" quer torná-la "mártir" << Psol vai ao CNJ contra juíza que chamou Marielle de "cadáver comum" e reproduziu fake news sobre aliança da vereadora com bandidosJá o advogado Antonio Rodrigo Machado, diretor da Ordem dos Advogados do Brasil no Distrito Federal (OAB-DF), considera que a representatividade de Marielle junto ao povo pobre do Rio faz com que sua morte tenha reflexos nas urnas, em outubro próximo. "Marielle representava um setor da política que compreende que a violência atual no nosso país tem causas históricas e público-alvo bem definido, que é a população negra e pobre de nossa nação. Nesse sentido, as ideias de Marielle, com a sua morte, tendem a se fortalecer enquanto simbologia da defesa de um método de política, em que as pessoas consideradas pelo sistema como cidadãos de segunda classe devem ter tratamento cidadão, digno, de igualdade perante toda a sociedade", explicou. Antonio lembra que, segundo o Atlas de Violência do Fórum Brasileiro de Segurança Pública de 2017, a cada cem homicídios, 71 são de pessoas negras. O advogado citou ainda os números, de 2016 para 2017, que ressaltaram o aumento de mortes da população negra, enquanto, por outro lado, diminuiu o percentual de brancos na estatística de assassinatos. Antonio destaca que, quando defendia suas ideias, Marielle tinha sua voz ouvida onde o Estado não chegava. "Ideias como a da Marielle, que se voltam contra o assassinato do povo negro, tendem a ganhar maior visibilidade com sua morte. Como já disse o poeta, nenhuma bala tem a capacidade de matar uma ideia. Eu complemento dizendo que os holofotes em cima do assassinato da Marielle terão como consequência uma visibilidade ampliada acerca daquilo que ela defendia. Essa simbologia vai interferir no debate - como hoje já interfere em mesas de bar, em grupos de amigos, familiares, nos espaços institucionais. Esse é um tema que vai vir à mesa em todos os lugares, em todos os espaços. E, consequentemente, aquilo que ela defendia vai se tornar pauta política, especialmente nas eleições", vislumbrou o representante da OAB, para quem a intervenção decretada por Temer foi uma decisão "atabalhoada" e tomada sem diálogo, "a portas fechadas", pelo mesmo governo que gastou "rios de dinheiro em propaganda da reforma da Previdência". Fundo do poço Isoladamente, como lembra Antonio Rodrigo, a própria intervenção federal no Rio, que sequer especificou seu orçamento, foi posta ainda mais em xeque com o caso Marielle. Para muitos, trata-se de uma demonstração de crueldade do crime que, em ano eleitoral e com o governo rejeitado por mais de 90% da população, configura-se como uma dor de cabeça extra (e de consequências imprevisíveis) para Temer. Mas, para a jornalista e analista de tendências fluminense, Daniella Sholl, é preciso esperar o desenrolar das investigações para saber se o caso chegará às urnas em outubro. "Vai depender do resultado da investigação, de quem matou [Marielle]. Se for uma investigação bem rápida, e tudo indica que vai ser, a gente vai ter uma noção melhor de quem cometeu esse crime - se foi milícia, se foi Polícia Militar. Independentemente do resultado, o que está acontecendo é consequência dessa falta absurda de comando do Estado. A gente já estava no fundo do poço e descobrimos que não, que o fundo do poço pode ser mais fundo", opinou Daniella, fundadora da DS Comunicação, agência especializada em Comunicação e Relações Públicas. Para Daniella, embora a intervenção fosse inevitável, suas consequências vão ser cada vez mais sentidas. "Faz todo o sentido de que isso poderia ser uma reação de alguns setores, da própria polícia, insatisfeitos com a intervenção", acrescentou a analista, com sotaque carioca e conhecimento de causa.
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