"Minha tese não é de que o mercado precifica mal ou de que não sabem precificar o risco brasileiro, mas que reagem mal aos sinais que são dados", escreve criador do Estudos de Política em Pauta FGV[fotografo]Reprodução[/fotografo]
Vinicius Franco*
Há algo de incompleto nas análises do chamado "mercado" - ou simplesmente a dificuldade de compreender o cenário eleitoral como um todo. A decisão dos investidores para o Brasil é que o futuro Presidente, acompanhado da sua equipe econômica, leve uma agenda Temer 2.0, com legitimidade do voto e a pacificação do Congresso Nacional, ou seja, menos intervencionismo, reformas e privatizações.
Não há o que julgar nesse sentido, a construção ideológica e programática desse grupo de investidores é natural e importante para o ambiente de negócios brasileiro. É saudável para a nossa democracia a preocupação com a "bomba fiscal" - que acompanha um sistema de previdência falido e arcaico, diversos programas sociais mal avaliados, gastos correntes em trajetórias crescentes e por fim um Estado de privilégios, que em gastos não fazem o déficit previdenciário, mas assustam um brasileiro remunerado com um salário mínimo.
O que preocupa, de maneira sincera, é a incapacidade de leitura, e também, a reação de pânico que o mercado teve com a divulgação das pesquisas Ibope e Datafolha na semana do dia 19/08. Ouvi dizer que o mercado sempre trabalha - ou precifica, como gostam de dizer - olhando para o futuro. A pergunta que fica é: o que as pesquisas eleitorais dizem exatamente sobre o futuro? Na minha visão, muito pouco. O momento eleitoral é completamente incerto - o que vale um dólar com tendência de desvalorização - mas os principais medos do mercado não estão alinhados a incerteza, mas sim, a dois nomes: Lula e Haddad.
Quando Geraldo Alckmin fechou o apoio do "centrão" - grupo majoritariamente avesso ao desejo do eleitorado - o mercado precificou como algo positivo e o dólar caiu no dia seguinte. O regozijo e o delírio do mercado duraram algum tempo - maior do que merecido - até o susto turco e as pesquisas daquela semana relatarem uma manutenção do quadro já existente anterior e posterior às alianças partidárias do PSDB. A indagação é a seguinte: é possível que o mercado acredite que as alianças nacionais teriam algum efeito sem o início da campanha de TV e rádio? Ou melhor, será que o mercado simplesmente observou o real cenário do início do ano?
A liderança do Lula e a força de Bolsonaro como segundo lugar nunca deixaram de ser verdade - até onde posso lembrar. A minha tese não é de que o mercado precifica mal ou de que não sabem precificar o risco brasileiro, mas que reage mal aos sinais que são dados, pelo menos em questões políticas. A campanha de João Doria, para prefeitura de São Paulo em 2016, registrava nesse momento em que estamos, entre agosto e setembro, nada expressivos 4% e 5%.
O paralelo Brasil-São Paulo é imperfeito e incongruente, mas indica o fato de que as eleições ainda estão incertas e repito - disso o mercado tem direito de reclamar. De resto, as pesquisas eleitorais dessa semana só mostram o quadro fragmentado e incerto - a tendência consolidada de Bolsonaro nas respostas espontâneas e a possível - repito - possível transferência de votos para Haddad que o leve para segundo turno. No entanto, esses fatos não são novidades no jogo eleitoral e os sinais dessa tendência já podiam ser observados quando o mercado sorriu ao ex-governador. Mas esse texto pode ser tolice e ingenuidade minha, e aí peço perdão, pois o nosso crítico literário Roberto Schwarz compreendeu que as ideias da elite são desconexas do pensamento
versus realidade. É importante, portanto, acompanhar o movimento em que a falsidade se torna, por fim, real.
Vinícius Franco é graduando em Administração Pública pela FGV-SP, criou e presidiu - entre 2017 e 2018 - o núcleo de Estudos de Política em Pauta FGV (Epep/FGV), que organizou vários debates sobre temas políticos e econômicos. Também foi responsável pela área de pesquisa no Centro de Microfinanças e Inclusão Financeira (Cemif) da FGV.