Bolsonaro com bandeira de Israel[fotografo]Divulgação[/fotogafo]
A
comunidade judaica decidiu reagir às reiteradas comparações feitas por integrantes do governo Jair Bolsonaro e aliados ao nazismo - movimento fascista alemão que matou cerca de 6 milhões de judeus - sempre que se veem em dificuldade. Pelo menos quatro entidades brasileiras e uma norte-americana se manifestaram nesta semana condenando declarações do ministro da Educação
Abraham Weintraub (Educação), do ex-deputado cassado
Roberto Jefferson (PTB-RJ) e do blogueiro Allan dos Santos. Os três são alvos do inquérito que apura a
existência de um esquema de fake news e ataques a autoridades e instituições e democráticas.
Neto de judeus que emigraram para o Brasil fugindo da perseguição nazista, Weintraub se referiu, na quarta-feira (28), dia da ação da Polícia Federal determinada pelo ministro de Alexandre de Moraes, à trágica "Noite dos cristais". O ministro se referiu a ataques executados em 10 de novembro de 1938 que resultaram na morte de cerca de 90 judeus, no incêndio de mais de 250 sinagogas e na destruição de 7 mil estabelecimentos de semitas. Os atentados foram planejados por Joseph Goebbels, chefe da propaganda de Adolf Hitler.
O ministro concluiu sua manifestação no Twitter com a expressão alemã
"sieg heil" ("viva a vitória", em português), usada com frequência por nazistas. Roberto Jefferson comparou o STF, que já o condenou por participação no esquema do mensalão, ao nazista Tribunal do Reich. Já Allan dos Santos associou Alexandre de Moraes a Hitler.
A reação mais dura veio do Instituto Brasil-Israel. "É risível e trágico: aqueles que incorporam a linguagem e a estética nazista agora acusam os outros da mesma coisa para se vitimizarem", diz nota divulgada pela entidade. "Apenas parem. Vocês ofendem a memória das verdadeiras vítimas do nazismo e não enganam ninguém", acrescentou (veja a íntegra da nota no fim da reportagem).
O instituto também destacou outros episódios envolvendo integrantes do governo. "Em meados de janeiro, o ex-secretário de cultura Roberto Alvim divulgou um vídeo emulando a estética e o discurso de Joseph Goebbels; e ainda este mês, a Secretaria Especial de Comunicação Social da Presidência (Secom) publicou uma variação da frase escrita nos portões do campo de concentração de Auschwitz: 'O trabalho liberta'".
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"A comparação feita pelo ministro Abraham Weintraub é, portanto, totalmente descabida e inoportuna, minimizando de forma inaceitável aqueles terríveis acontecimentos, início da marcha nazista que culminou na morte de 6 milhões de judeus, além de outras minorias", condenou a Comunidade Israelita do Brasil.
A declaração de Weintraub também foi objeto de repúdio do coletivo Judeus pela Democracia. "A ação a mando do STF visa buscar quem financia Fake News e evitar novos linchamentos virtuais. A Noite dos Cristais não foi virtual, mas foi o linchamento real a judeus", escreveu o coletivo no Twitter.
No início de maio o grupo protestou contra o uso da bandeira de Israel em manifestação pró-intervenção militar.
O Museu do Holocausto de Curitiba considerou uma "analogia inoportuna" a citação da "Noite dos cristais" pelo ministro.
A comparação feita por Weintraub também repercutiu de maneira negativa no exterior. O Comitê Judaico Americano, uma das principais organizações da comunidade judaica nos Estados Unidos, pediu o fim do uso político do holocausto no Brasil.
"Chega! O reiterado uso político de termos referentes ao Holocausto por oficiais do governo brasileiro é profundamente ofensivo para a comunidade judaica e insulta as vítimas e os sobreviventes do terror nazista. Isso precisa parar imediatamente", disse a associação pelo
Twitter, em inglês.
O cônsul-geral de Israel em São Paulo, Alon Lavi, também repudiou a declaração do ministro da Educação. "O Holocausto, a maior tragédia da história moderna, onde 6 milhões de judeus, homens, mulheres, idosos e crianças foram sistematicamente assassinados pela barbárie nazista, é sem precedentes. Esse episódio jamais poderá ser comparado com qualquer realidade política no mundo", escreveu Lavi.
Weintraub invocou na mesma rede social o direito de falar do holocausto, na condição de neto de judeus que sobreviveram ao campo de concentração.
Em outra postagem, o ministro disse que cresceu "escutando como os Weintraub foram caçados e como sobreviveram ao inferno de Hitler". "Escutei como a SS Totenkopft entrava nas casas das famílias inimigas do Nazismo. Nesse momento sombrio, digo apenas uma palavra aos irmãos que tiveram seus lares violados: liberdade!", escreveu.
Bolsonaro tem proximidade política com o premiê israelense Benjamin Netanyahu. Ele foi uma das principais autoridades estrangeiras a comparecer à posse do presidente brasileiro em 1º de janeiro de 2019. Durante tragédia de Brumadinho, militares israelenses ajudaram nas buscas.
Desde a campanha eleitoral o presidente brasileiro tem prometido transferir a embaixada do país em Israel de Tel-Aviv para a cidade santa de Jerusalém. A medida, até hoje não tomada, é objeto de críticas da comunidade árabe. Também pesa na relação o apoio dado a Bolsonaro pelos evangélicos, simpáticos a Israel.
Em março do ano passado, o brasileiro saudou Netanyahu como "irmão" durante viagem a Israel. "Prezado irmão Netanyahu, é uma honra voltar a Israel. Realizo esta visita antes mesmo de completar cem dias de mandato. Meu governo está firmemente decidido a fortalecer a parceria entre o Brasil e Israel. A amizade entre nossos povos é histórica. Tivemos um pequeno momento de afastamento, mas Deus sabe o que faz", disse o presidente, ao lado do primeiro-ministro israelense.
Os dois têm conduzido a crise provocada pela pandemia de maneira antagônica. Enquanto Israel adota um dos modelos mais restritivos de isolamento social, Bolsonaro faz campanha contra o distanciamento. Enquanto Netanyahu se aproximou de adversários para enfrentar a crise, o presidente brasileiro acirrou o confronto com governadores e o Supremo Tribunal Federal.
Veja a íntegra da nota divulgada pelo Instituto Brasil-Israel:
"Alusões ao nazismo apareceram novamente na cena pública brasileira
Na luta aberta que estamos assistindo entre o poder executivo e o poder judiciário, alusões ao nazismo apareceram novamente na cena pública brasileira. Dessa vez, em jogo reverso.Como todos sabem, ministros do governo federal têm sido criticados por trazerem à tona discursos que se assemelham ao nazismo, em forma e conteúdo. Em meados de janeiro, o ex-secretário de cultura Roberto Alvim divulgou um vídeo emulando a estética e o discurso de Joseph Goebbels; e ainda este mês, a Secretaria Especial de Comunicação Social da Presidência (Secom) publicou uma variação da frase escrita nos portões do campo de concentração de Auschwitz: "O trabalho liberta".Agora, invertendo as acusações, membros do executivo nacional e aliados de Bolsonaro reagem ao inquérito das Fake News do STF tratando seus ministros como nazistas.
Entre ontem e hoje, para citar alguns exemplos:
[1] Roberto Jefferson, presidente nacional do PTB, investigado por disseminação de fake news e ataques à instituições nas redes sociais, se referiu ao STF como o Tribunal do Terceiro Reich, instituído por Hitler.
[2] Abraham Weintraub, ministro da educação, fez alusão à caça aos judeus pelos nazistas para se referir à ação da PF iniciada a partir da determinação do STF. Segundo ele, o dia de hoje será lembrado como a "Noite dos Cristais" brasileira.
[3] Allan do Santos, jornalista do Terça Livre e alvo da mesma operação da Polícia Federal, compara o Ministro Alexandre de Moraes a Hitler.
É risível e trágico: aqueles que incorporam a linguagem e a estética nazista agora acusam os outros da mesma coisa para se vitimizarem.
Apenas parem. Vocês ofendem a memória das verdadeiras vítimas do nazismo e não enganam ninguém."
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